Superando o medo de viajar e de tomar decisões difíceis

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Superando o medo de viajar

Eu e a patroa estávamos planejando uma viagem faz tempo.

Queríamos ir para um lugar, depois já queríamos ir para outro. Queríamos ir o mais cedo possível, mas coisas aconteceram e foram adiando a viagem. Tudo foi se arrastando e o plano de sair por aí para conhecer novos lugares ficava cada vez mais confuso. Até que um dia nos resolvemos.

Consideramos nossas finanças, nosso tempo disponível, nossos planos futuros e decidimos: iríamos para a América do Sul. Com a decisão da região, veio a decisão do lugar: o ponto de partida seria Buenos Aires. Só faltava definir a data...

A patroa navegou por semanas em sites e desbravou o mundo das passagens aéreas para achar um voo que fosse o mais vantajoso pra gente. Ela tem um blog de viagem e entende do assunto, então acabou achando um voo supimpa. Me mostrou o cronograma e perguntou: "vamos comprar?"

Eu vinha há meses querendo comprar uma passagem. Definir data e horário para um plano acontecer é libertador. Comprar a passagem é transformar um plano teórico em algo concreto. Mas quando ela fez a pergunta, me bateu um medinho. Falei que precisava resolver algumas coisas antes. Precisava verificar uns assuntos.

Sozinho, parei para pensar sobre a viagem e senti medo de novo. Mas ué, não era isso que eu tanto queria? Que porra que me deu de sentir medo de viajar agora?


Medo de tomar decisões

Algo me impedia. Sabia que viajar era o que eu queria, disso não tinha dúvidas, mas estava confuso. Não sabia o que estava acontecendo e comecei a culpar diversos problemas. "Tenho que vender minha moto arrebentada primeiro", "preciso deixar umas coisas preparadas antes de viajar".... várias desculpas vieram à cabeça.

Mas os dias foram passando e fui perdendo tempo. Me olhei no espelho e me perguntei: "que porra tá te impedindo??" Eu sinceramente não sabia, mas buscava respostas para o meu súbito medo de viajar.

Com a cabeça confusa, resolvi que o melhor jeito de organizar meus pensamentos era usar a boa e velha dupla papel e caneta. Peguei uma folha de rascunho, uma bic velha, sentei na mesa e comecei a listar diversos assuntos que estavam me preocupando, ou que poderiam ser motivo de preocupação.

Para cada assunto, analisava em geral 2 fatores: a) esse assunto realmente é um problema?; b) se é um problema, como fazer para resolvê-lo antes de ir viajar?

Não demorei muito não. Em questão de 15 minutos, botei tudo na folha à minha frente. Em 1/4 de hora, criei um breve panorama da minha vida atual que me dizia claramente: não há motivos para se preocupar. Mesmo com a mensagem bem clara na minha frente, só fui internalizá-la no dia seguinte. Acordei com a mente mais limpa e com o eco daquilo que a folha riscada estava gritando na minha cara: "vai viajar!"

Resultado: sentei na frente do computador, encontrei a passagem que queria e comprei.

Viagem Buenos Aires América Latina
Foda-se o medo de viajar, pretendo conhecer ao menos Buenos Aires, Córdoba, Santiago e Deserto do Atacama

Simples assim. Tudo que precisei foi pensar um pouco e clarear as ideias. Vou explicar um pouco melhor como eu fiz e como você também pode fazer para derrotar o medo de viajar (ou medo de tomar outras decisões difíceis).

OBS: Acredito muito que esta abordagem pode ser adaptada para qualquer ocasião da vida em que você se sinta com medo de tomar decisões e dar um passo a frente.

No vídeo abaixo, falo sobre a viagem que vem por aí




O método

Pegue um papel e uma caneta, escreva cada um dos assuntos que vou citar abaixo e analise se algum deles, por algum motivo, te impede de viajar (ou de fazer o que você quer).

Esquema perder medo de viajar
Parte da minha esquematização: ao lado dos assuntos, escrevi como resolvê-los ou "NP" de "no problem"

É impossível ser mais simples, mas vou explicar melhor cada um dos assuntos:


Família e amigos

Analise família e amigos de forma separada, mas sob o mesmo espectro. Se quer viajar, pense em quem poderia sentir muito a sua falta. Não uma saudade normal, mas sentir falta de você de verdade. Aqui cabem parentes que estejam mal de saúde, tipo um irmão acidentado ou um pai com depressão séria. Você faz a diferença quando está por aqui, pode de fato amenizar os problemas deles? Se sim, talvez valha a pena postergar a viagem, esperando até que as coisas melhorem. Se você é quem dá base para o seu pai depressivo seguir em frente, por exemplo, não dá para abandonar. Mas não se engane: problemas comuns e pouco sérios todos têm. Se você achar que não pode ir embora só porque um amigo terminou o namoro ou beltrano está desempregado, vai acabar nunca saindo do lugar.

Como eu fiz: No meu caso foi bem simples. Meus amigos estão todos bem e tocando suas vidas. Mesmo morando muito perto, por vezes tenho dificuldades em me encontrar com um ou outro. O contato acaba se dando bastante virtualmente, mas nem tanto em um bar ou na casa de alguém. Espero que sintam minha falta, mas ir embora não vai fazer uma diferença tão gritante na vida de nenhum deles. Na minha família as coisas são diferentes. Há alguns problemas com gente muito querida, mas problemas que sou incapaz de resolver. Problemas que não consegui amenizar ou solucionar estando aqui do lado e que certamente, não sendo meus, não podem me impedir de tocar a minha vida para frente. De saúde todos estão bem, então posso ir viajar sem medo.


Amor

Aqui o bicho pega. Talvez você tenha começado um namoro há pouco e não queira se distanciar da pessoa amada. Talvez namore há anos e quem você ama não pode viajar junto. Como fazer?

Isso é uma questão bem complicada que vai de cada um, mas em suma você precisa pesar o que é mais importante para você: a relação ou a viagem? Lembre-se de analisar qualquer relação com um pé atrás: se você está mudando de "amor" a cada mês, não vai deixar que uma pessoa que não signifique tanto assim mude os seus planos, vai?

Como eu fiz: Por sorte minha esposa vai viajar junto, então nem tenho o que analisar, é só fazer as malas! :)


Casa

Se você for passar bastante tempo viajando, talvez tenha que ver o que fazer com a sua moradia. Se mora de aluguel, é importante saber quanto tempo falta para o término do contrato e quanto é a multa de rompimento. Talvez valha a pena esperar 1 ou 2 meses antes de viajar para evitar pagar uma taxa desnecessária. Se você divide a moradia, é justo arrumar alguém para o seu lugar antes de se mudar. Se mora com os pais e já passou com sucesso pelo "família e amigos" ali de cima, vai viajar feliz que você pode até sentir uma saudade de casa, mas não vai se arrepender!

Como eu fiz: Minha situação de moradia é complicada, mas se fosse pra resumir eu diria que moro de favor com a minha irmã. Pago contas normalmente, mas estou fazendo hora extra na casa. Só precisei avisar a mana que eu planejava ir embora em breve e pronto. Agora é só vazar!


Estudo (faculdade ou outros cursos)

Dependendo de quanto tempo você vai ficar fora, talvez tenha que trancar o seu curso. Para não perder sua vaga, vale ficar atento às regras de quanto tempo o aluno pode ficar com a matrícula trancada. A UFSC aqui em Floripa, por exemplo, considera abandono se você trancar por mais de 4 semestres. Caso seu curso esteja no final, pode valer a pena adiar um pouco a viagem para poder sair fora com a mente limpa, sem ter um curso pendente para ser terminado depois.

Como eu fiz: Tenho uma matrícula ativa mas não tenho grandes planos de completar o curso, então só preciso lembrar de trancar a matrícula nos dias designados.


Trabalho

Se você tem um emprego fixo e pretende ficar fora por mais de 1 mês, as chances são gigantes de que nem as suas férias nem um bom papo com o chefe te salvem. Pese bem o que vale mais: manter seu emprego ou se aventurar em uma viagem. Possivelmente a viagem te tomará dinheiro ao invés de te fornecer, mas os ganhos que trazem em termos de felicidade e crescimento pessoal são inestimáveis. Não é à toa que dizem:

"Viagem é a única coisa que você compra que te deixa mais rico"

Como eu fiz: Eu trabalho de casa (veja aqui como você também pode). Para viajar não preciso me demitir de coisa nenhuma, mas tenho que ficar atento. Quem gosta de pular muito de uma cidade para outra enquanto viaja, às vezes ficando em lugares baratos, precisa tomar cuidado com o acesso à internet. Se eu não tiver uma conexão boa, não vou poder trabalhar e certamente serei mandado pra rua virtual. Por isso, só preciso me certificar de antemão que os lugares onde me hospedarei têm internet rápida e estável.


Alegria de viver

Este é um ponto subjetivo, mas certamente um dos mais importantes. É muito simples: viajar vai te deixar mais feliz?

Talvez você esteja infeliz pra caralho no trabalho, talvez esteja de saco cheio de morar com quem mora. Talvez seu relacionamento tenha ido para o espaço e você precise limpar a cabeça. Em todas essas situações, viajar certamente vai ajudar. Aliás, limpar a cabeça em terras desconhecidas pode ser ótimo para atacar esses três problemas. Quem sabe você não clareia as ideias e decida buscar um novo rumo profissional? De repente pode decidir se mudar de mala e cuia para o lugar que foi visitar, ou pode vislumbrar que voltar para a sua cidade de moradia é a última coisa que quer fazer. E se conhecer alguém legal durante a viagem? Desenvolver um relacionamento viajando pode ser difícil, mas há casos e mais casos de gente que encontrou alguém legal nessa situação. E se não encontrar ninguém, a chance de esquecer um pouco o seu relacionamento fodido, ou um término doloroso, é grande.

Como eu fiz: Como eu disse, esse é um ponto chave pra mim. Não é que eu esteja infeliz, longe disso. Estou morando bem, comendo bem, com uma vida social até que bem ativa, bem no amor, ganhando minha graninha. Não tenho muito do que reclamar. Mas a vida é curta e o mundo é grande, então não posso me dar ao luxo de desperdiçar tempo de vida - o recurso mais valioso que temos - ficando sempre no mesmo lugar e fazendo as mesmas coisas. Minha rotina anda muito igual há muito tempo. Pouca coisa nova acontece. Tenho poucos momentos daqueles em que fico genuinamente feliz, empolgado com algo, com um sorriso de orelha a orelha. Quando vemos lugares novos, é mais fácil encontrar momentos assim. O choque de coisas novas (e boas) é extremamente positivo na vida de qualquer um. Por isso, tenho certeza que viajar só vai melhorar minha vida nesse momento.


Assuntos específicos

Aqui entram os mais diversos problemas específicos que cada um de nós tem. Pode ser um processo na justiça, uma venda enrolada ou uma documentação para resolver, por exemplo.

Como eu fiz: Estes assuntos específicos eram o que mais me preocupava antes de comprar minha passagem. Temos um carro que está na família há anos e mais recentemente caiu no meu colo. Acontece que ele é o protagonista de uma saga interminável de problemas, indo da sua própria saúde (é um carro velho e acabado) até problemas com documentação que se alastram há anos. "Há anos": tá aí a indicação de que eu não deveria deixar esse carro ficar no meu caminho. Adoraria resolver o problema agora - e até vinha dando passos nessa direção - mas permitir que um problema tão antigo me impeça de seguir em frente é loucura.

Outra questão similar é minha moto: está toda arrebentada depois do meu acidente e preciso dar um jeito nela. Não sabia se mandava arrumar, se vendia ou se deixava parada até voltar pro Brasil, mas agora encaminhei a venda. É só assinar a papelada e pronto: um problema a menos.

Também estou com um processo em andamento para retirar a minha cidadania italiana. Tenho tudo meio encaminhado e uma nova lei está para entrar em vigor e alterar a forma como as coisas são feitas, então me resta aguardar. Aliás, dar prosseguimento ao processo da cidadania é exatamente o motivo pelo qual volto pro Brasil já em agosto.


Dinheiro

É aqui que o bicho pega. Sem dúvida alguma a falta de grana é a maior desculpa já usada na história para o "medo" de viajar.

É claro que é preciso grana pra viajar, mas é preciso grana para viver em qualquer lugar também. Dependendo de onde você for e quais forem os seus planos, é possível viver mais barato ou com um custo mensal similar ao que você tem hoje. Estude bem as alternativas e faça as contas.

Sou levemente conservador em termos financeiros. Por isso, só não indico viajar em casos onde você vai ficar absolutamente quebrado quando voltar pra casa, sem dinheiro para coisa alguma. Aí vale a pena pesar bem se a hora é certa ou se vale a pena juntar mais uma grana de reserva antes. Mas convém lembrar de uma história:

Lui tinha um emprego fixo e ganhava bem. Gastava bastante e não costumava juntar muita grana, mas queria viajar. Morria de medo de torrar todo o seu dinheiro ou de interromper a sua carreira em ascensão. Ele tinha esperanças de ser promovido em 6 meses, de ganhar mais em breve, de conseguir bonificações de final de ano. Seria loucura pedir demissão agora, não? Imagina só, largar tudo e acabar voltando pra casa quebrado e desempregado! Lui estava confuso e com medo de tomar decisões. Um dia tomou uma mijada daquelas do chefe e foi pra casa puto da vida. Reclamou com os amigos, deitou a cabeça no travesseiro e pensou qual seria a pior coisa que aconteceria se ele perdesse o emprego agora, ou se ficasse sem dinheiro. Desligou o despertador de propósito na manhã seguinte e acordou já passando do meio-dia. O telefone tocou mas não era o alarme. Ali, pelo telefone mesmo, ele pediu demissão ao seu chefe. Não foi a atitude mais profissional, mas Lui estava contente. Tomou um café da manhã tardio em casa e começou a planejar sua viagem. E foi viajar. Tinha poucas preocupações na cabeça e conseguiu conhecer uma porra de lugares novos. Quando voltou para a sua cidade, tirou um extrato no banco e viu que estava quebrado. Precisava fazer dinheiro. Foi aí que arranjou um outro emprego, bem parecido com o que tinha antes, que oferecia premiação no final do ano e trazia boas perspectivas de crescimento profissional.

No primeiro dia de trabalho, Lui foi ao banheiro da firma, se olhou no espelho e abriu um sorriso. Sorriu porque tinha aprendido tanto na viagem que fez, crescido tanto como pessoa e tido tantos momentos felizes que tudo tinha valido a pena. Afinal, o pior que poderia acontecer era Lui voltar exatamente para a mesma situação em que estava antes da viagem.

Pergunte-se: o que lhe impediria de retomar a sua vida em termos financeiros se você passasse 1, 3, 12 ou 50 meses fora? Muitas vezes a resposta vai ser "nada".

Como eu fiz: Sou um cara que gasta muito pouco, mas muito mesmo. Costumo economizar em tudo e tenho um tino para juntar dinheiro desde que sou pequeno. Venho acumulando meus trocados há anos e hoje estou em uma situação onde posso viajar sem medo. Além disso, planejo gastar viajando não muito mais do que gasto morando aqui em Floripa. Tirando a passagem de avião, os custos devem se aproximar - afinal, ninguém paga água, luz, internet e condomínio se estiver viajando! :)


Considerações finais

Certamente há outros aspectos da vida que devem ser analisados mas não estão no texto. Vai de cada um adicionar ou retirar coisas desta metodologia. Lembre-se de adaptar tudo à sua própria realidade.

Algo que não incluí ali foram os objetivos de vida. No meu caso, meu objetivo de curtíssimo prazo é aprender espanhol, então a viagem para a América do Sul será de grande valia, um investimento. Talvez você tenha um objetivo que possa ser alcançado mais fácil ou que possa ser paralizado caso você vá viajar, então é bom considerar bem: o que você quer?

Fiz essa metodologia basicona para superar o medo de viajar, mas creio que ela possa ser usada para outras coisas, como descobrir o que está te impedindo de trocar de emprego, de mudar de cidade, de chutar a bunda do seu namorado, de demitir um funcionário, de comprar uma casa e por aí vai. Para mim ficou claro que nada me impedia além de mim mesmo. Meus próprios medos irracionais internos estavam me impedindo. E vou te falar algo sobre medos irracionais: não deixe que te paralisem. Caso contrário, depois de um filme de terror você vai preferir morrer de sede do que ir na cozinha escura buscar um copo d'água.

As análises são simples e direto ao ponto, mas depois de pensar em tudo isso acordei com a cabeça limpa. Acordei certo do que queria fazer. E o resultado foi esse:


Espero que todo esse esquemão que expliquei possa ajudar alguém. Se você se sentiu ajudado, não esqueça de deixar um comentário para que eu fique sabendo. Se gostou do tema geral do artigo, talvez também curta o vídeo abaixo, onde falo sobre o sentimento recorrente que temos de estarmos perdidos na vida. E como sempre, muitíssimo obrigado pelo apoio e por ler mais um artigo, de coração! :)))




2 comentários:

  1. Cara, brigada, estava precisando escutar algo assim...tá difícil aqui, mas suas palavras me trouxeram esperança e deram uma acalmada no meu coração! Tudo vai dar certo, eu acredito!

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    1. Fico feliz de ter conseguido contribuir de alguma forma, Raquel. Obrigado pelo apoio e boa sorte!

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