Manter a essência ou se render?

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"Admiro sua honestidade, mas uma hora será preciso se adaptar ao público".

Um brother me falou algo assim no twitter recentemente. Acabei nem respondendo nada pra ele, só deixei a informação entrar na minha cabeça e pensei nela. Eu tinha acabado de falar que o 2Bits era o anti-herói da internet, com textos longos e pouca preocupação com SEO, numa era de posts em listas numeradas, com conteúdo raso e focado em palavras-chave.

O que o brother quis dizer, acredito eu, é que pra dar um passo maior, fazer sucesso, é preciso balancear um pouco melhor as coisas. Em termos de SEO, concordo plenamente. Não pretendo forçar keywords nos meus textos, mas tenho tentado estudar um pouco pra conseguir colocar o 2Bits nos resultados do Google. Já em termos de mudar o conteúdo, a coisa é diferente. Gosto de acreditar que o conteúdo do 2Bits é relevante e realmente faz alguma diferença na vida de quem lê.

Muitos artistas, ou pessoas que criam alguma coisa, eventualmente se deparam com o dilema: manter a essência ou se render ao que dá mais certo.


Sobre manter a essência

De vez em quando ainda leio notícias sobre Tibia, um jogo que eu curtia muito na minha adolescência. É um game que te dá acesso a muita coisa gratuitamente, mas que possui áreas do mapa e recursos exclusivos para quem paga. Devagarinho os desenvolvedores foram adicionando outras coisas que você consegue apenas pagando: uma roupa estilosa aqui, uma montaria que te deixa mais rápido ali. E isso gerou questionamentos na apaixonada e fiel comunidade do jogo. "Algum dia vocês planejam abraçar totalmente o modelo de microtransações, botando até itens para serem vendidos diretamente com dinheiro real?", alguém perguntou no fórum. Esse certamente não é o espírito do jogo, mas uma pessoa da Cipsoft, desenvolvedora do Tibia, respondeu de forma sincera: "Não pretendemos, mas não descartamos completamente a possibilidade no futuro". O jogo já não é tão popular como antigamente e andou meio mal das pernas. Diante disso, a desenvolvedora deixou claro que, se preciso, o game pode se voltar à um modelo de microtransações para sobreviver. Não é o que desejam, mas se for necessário, fazer o quê?! Você preferiria ter o seu jogo favorito meio zuado, mas funcionando, ou ver o jogo favorito ser encerrado? Até os fãs mais incompreensivos devem preferir a primeira opção. E não é só com o Tibia que esse dilema se apresenta.

Manter a Essência - Tibia Microtransações
Medo da comunidade é que o jogo vá pro caminho do pay-to-win (pagar pra ficar mais forte)

No caso do blog, desde que comecei prometi pra mim mesmo que nunca iria perder duas coisas: originalidade e espontaneidade. A originalidade é importante porque de conteúdo parecido a internet tá cheio. É só chutar uma moita virtual que caem dezenas de artigos sobre qualquer tópico que você pesquisar. Claro que também tem muita coisa boa, mas muitos destes artigos são pobres em conteúdo, ou repetem o que foi dito em outros lugares. Não quero dizer que todos os textos que escrevo são ultra originais, nem que tem um conteúdo absolutamente de primeira. Pelo contrário, quem me acompanha no twitter viu que eu quase não postei o texto sobre vícios, porque achei que não tinha ficado tão legal quanto eu gostaria. Mas a busca por escrever textos completos, linkando assuntos interessantes com coisas que vivi, e que instiguem algum tipo de melhoria na vida de quem lê, isso continua. E espero que continue sempre.

A espontaneidade é igualmente importante. Se o cara pensar muito antes de fazer as coisas, acaba desistindo de muitas delas. Perdi as contas de quantas vezes escrevi algo e fiquei na dúvida se publicava ou não, tanto no blog quanto no twitter. Talvez você passe pelo mesmo diariamente. Cancela um tweet, ou não manda aquela mensagem pra alguém no Whats, ou chega a escrever mas não comenta aqui no post por algum motivo. No fim das contas, tento sempre me forçar a publicar. Simplesmente porque o que veio na minha cabeça naquela hora é quem eu sou. Então vale a pena postar.


Vender ou não vender a alma pro capeta?

Nicole Scherzinger é a ex-líder das Pussycat Dolls, um desses grupos de música pop compostos de várias minas atraentes e formados pra vender discos e fazer grana. Ela começou num outro grupo, que não faço ideia do que era, mas que esse artigo descreve como sendo mais voltado à arte e a música.

"Minha resposta quando fui convidada foi 'nem a pau!'. Venho de uma família religiosa e conservadora, então fiquei nervosa e confusa. Não entendia porque queriam fazer eu usar lingerie. Pra ser honesta, eu queria ser uma guria mais safada. Provavelmente seria muito mais bem sucedida se eu fosse mais safada. Essa é uma indústria complicada. Pra se dar bem, você precisa realmente vender a alma pro diabo! Não vendi a minha e provavelmente é por isso que não cheguei ao topo."

No meio dessa entrevista, ela dá a entender que "não teve escolha" e precisou entrar pras Pussycat Dolls porque era uma oportunidade muito boa (de ganhar grana e ficar famosa) pra se jogar fora, mas o discurso dela não deixa de ser interessante. Pode explicar como muitos artistas acabam abandonando aquilo que os trouxe um reconhecimento inicial pra agarrar fórmulas pré-prontas que são receitas mais certas de sucesso.

Manter a Essência - Pussycat Dolls
A Nicole é aquela ali do meio com cara de nervosa e confusa

Lealdade

Estes são casos um pouco diferentes pois os jogadores não mudam a essência do seu trabalho em si, mas acho que as histórias contribuem pro assunto.

Gerrard poderia ter saído do Liverpool diversas vezes. Teve proposta milionária do Real Madrid, inclusive, no seu auge. Mas preferiu ficar no Liverpool. Lá o cara se tornou uma lenda. Jogou por 17 anos e virou quase sinônimo do clube. História similar à de Totti, que aos 39 ainda joga na Roma, clube do seu coração e onde fez sua estreia há 22 anos. Rogério Ceni é outro caso, aqui em terras brasileiras. Tá pra se aposentar agora no fim do ano, mas passou sua carreira inteira no São Paulo, mesmo tendo chances de ir jogar na Europa. Enquanto muitos jogadores vão para clubes onde podem ser mais bem sucedidos financeiramente, ou onde podem ganhar mais títulos, outros preferem se apegar ao que o coração manda. Preferem ficar "em casa" durante toda a carreira.

Um ponto em comum entre todos esses jogadores que citei é que, mesmo depois de muito tempo, não se arrependem das decisões que tomaram. E por quê? Provavelmente porque o que consideram como felicidade, como sucesso, não é glória ou dinheiro, mas sim defender o que ama e ser reconhecido por isso.

Manter a Essência - Gerrard, Totti, Rogério Ceni
Gerrard, Totti e Ceni: ídolos máximos nos seus times
Certamente não há certo ou errado, apenas formas diferentes de se encarar as coisas. As decisões que tomamos certamente passam pelo que consideramos como sucesso.

Sucesso é vender bastante e ser aclamado? Sucesso é conseguir fazer algo significante, passar uma mensagem? Cada um tem uma interpretação.


Essência x evolução

É importante entender que nem toda mudança é ruim, mesmo que pareça. Se uma bandinha perdeu um pouco do seu charme inicial pra cair no popzão batido de rádio, por exemplo, pode ter sido por fins comerciais, mas também pode ter havido uma mudança natural na cabeça dos músicos que alterou a forma como eles enxergam o próprio trabalho e criam novas coisas. Assim como tudo no mundo, nós estamos sempre em transformação. Alguns mais, outros menos, mas todo mundo muda um pouco ao longo do tempo. É natural. O que não significa que a essência da pessoa, ou seus valores iniciais, foram perdidos.

"Gosto de olhar pra 5 anos atrás e ter vergonha do que eu fazia naquela época. Se isso acontece, se estou diferente hoje, é porque evoluí". Não tô conseguindo achar quem falou essa frase (e nem sei se a frase é exatamente essa), mas é um ponto de vista bem interessante das nossas próprias evoluções pessoais.


O que tudo isso tem a ver com você?

Ainda gosto muito de Maroon 5, mas os caras mudaram muito do primeiro álbum pra cá. De uma pegada bem mais leve e alternativa pra um pop eletrônico. Tem muita gente que critica eles, assim como critica outros artistas que "se venderam". Mas a gente também não se vende durante a vida?

Quando aceitamos um trabalho que odiamos porque paga melhor do que outro que gostamos, não estamos de certa forma nos vendendo?

Quando você deixa de vestir uma roupa confortável porque não é o padrão que as pessoas usam na rua, não está oprimindo seu jeito de ser?

Quando escondemos o gosto por um tipo de música, ou ficamos com medo de falar algo e sermos julgados, não estamos deixando nossa essência de lado?

O quanto de você mesmo você é? O quanto da sua essência foi perdida?






Amando, odiando ou ficando indiferente ao texto, comenta aí, vai! Melhor coisa que tem pro blogueiro é ver que alguém leu seu texto e comentou. E não esquece de falar comigo lá no twitter!


8 comentários:

  1. Oi, Pedro! Estou eu aqui de Novo! Seu post me chamou a atenção e esse é um assunto que eu discutia muito em casa, principalmente sobre música. O mais exemplo de "ter se vendido" pra mim foi a Avril Lavigne, e eu me revoltei durante muito tempo por isso (hsuahs), mas com o amadurecimento e as experiências eu fui entendendo como as coisas funcionam e, sendo sincera, eu concordo quando você diz que esse é um dilema aplicado às nossas vidas. Podemos certamente "nos vender" para sermos aceitos ou melhor adequados às nossas relações, e isso varia de pessoa pra pessoa. Eu me vi muito nesse tipo de experiência, sempre valorizei quem eu realmente sou e tive muita dificuldade com as pessoas me aceitando porque eu não "me vendia pra idéias e comportamentos prontos. Eu acho que essa postura realmente vai muito de como você se sente com relação a si próprio e sabe o quanto cada escolha e atitude pode te custar. Então, eu também acho que em algum ponta da sua vida você talvez venha a se contradizer devido s diversas circunstâncias, mas isso também não quer dizer que tenha "se vendido", pode ser que apenas tenha mudado o modo de pensar, ter evoluído como você mesmo mencionou no post. É interessante problematizar essas idéias, eu tenho um blog e eu também sofri esses comentários sobre se adequar, apesar de eu não postar muito. Porém, tomei uma atitude: o meu blog diz muito de mim e de quem eu sou, eu posto quando posso e quando acho que fiz uma boa reflexão sobre alguma coisa, ou sobre algo aleatório que eu queira muito falar. Então é no blog que eu me sinto livre ra falar do que quiser, e eu me sinto muito bem ele sendo assim ao invés de falar de "assuntos virais" pra chamar um público. Então, assim como voce e me mantive firme no que eu me sinto bem.
    Fica aqui a minha contribuição. Muito bom o seu post! Até a próxima!

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    1. O que talvez tenha faltado no post foi falar que esse lance de "se render" pode vir a calhar algumas vezes durante a vida, nem que sejam em pequenas atitudes ou momentos. De fato, as circunstâncias da vida são imprevisíveis e não dá pra cravar que jamais vou me contradizer, mas se depender apenas de mim (e na medida do possível), pretendo fazer só o que gosto e o que acho que vale a pena.
      Muito legal sua experiência de blogueira também, obrigado por compartilhar aqui! ;))

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  2. Esse tema da vez é um tanto complicado. Ao longo da vida somos tentados diversas vezes a abrir mão de nós mesmos, de nosso eu, abdicar de nossa vontade, de nos alienarmos de nossos próprios ideais... Quando é legítimo ou não fazer isso? A linha entre uma coisa e outra pode ser difícil de enxergar. Você foi muito feliz em deslocar esses questionamentos da esfera dos famosos ou pessoas públicas para a pessoa comum e as situações cotidianas, isto é, não são somente famosos que passam por isso (apesar de serem, por sua própria condição de notoriedade, os mais julgados por suas escolhas); esses dilemas fazem parte da vida de todo e qualquer mortal, toda pessoa debaixo do sol passará por isso em algum momento da vida – preservar a todo custo minha autenticidade/idiossincrasia da pressão/influência externa, ou ser “esperto” e agir conforme as circunstâncias ou conveniência? Existe um meio-termo???

    Em todo o caso, acredito que a tomada de decisão indica seu caráter, isto é, há um fundo de moralidade. Você é uma pessoa de princípios, que agirá em todas as situações conforme os seus princípios de verdade ou justiça, ou vive ao sabor do vento, pra onde ele soprar você vai? Sem dúvida a segunda pessoa não inspira muita confiança, ela demonstra não ser muito íntegra. Com isso quero dizer que não é algo totalmente subjetivo, há uma moralidade objetiva – uma pessoa que vive pela glória, pelo dinheiro ou pela fama constrói seu mundo em bases falsas e tudo pode ruir a qualquer momento. A pessoa vai tomar suas decisões conforme sua experiência, e certamente não há relativismo moral, e se a pessoa escolhe o lucro em detrimento de algo mais consistente e verdadeiro está demonstrando seus parâmetros éticos para a vida, tal como ela se encontra naquele momento do curso de sua vida.

    Mas esse embate entre essência e evolução é muito instigante e intrigante. A evolução é inevitável e necessária, mas a essência como tal não muda – do contrário aquilo se torna outra coisa, e num processo esquizofrênico, ruma à total perdição. Acredito, portanto, que a evolução não significa necessariamente a perda de essência, e se isto acontecer temos uma situação de inautenticidade. Citando um exemplo, as discussões eternas sobre os rumos da franquia de games Resident Evil: nos fóruns da vida os fãs se dividem entre antes e depois de Resident Evil 4, uns alegando que o jogo perdeu a essência a partir do RE4 em função da ganância pelo lucro, transformando o jogo em outra coisa que não Resident Evil, apenas herdando seu nome, e outros afirmam que simplesmente houve uma evolução, e que isso seria inevitável. Adivinhe qual minha opinião... A série simplesmente perdeu o tino cara, sem mais... kkk.

    Lembro do psicólogo Carl Rogers, quando afirma sobre congruência/autenticidade - quando o seu eu real se encontra em harmonia com seu eu-ideal (autoimagem), isto é, quando suas ações/atitudes estão conforme o conceito que você tem de si mesmo, então temos uma personalidade autêntica, ou, congruente. Ao mesmo tempo, Rogers fala de “consciência de seu self contínuo”. Ele afirma que a personalidade está em contínuo estado de fluxo, é uma entidade constantemente em mutação, porquanto ela esteja aberta à experiência, aos estímulos da vida.

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    1. O "Existe um meio-termo???", a relação entre as decisões e a nossa ética/caráter, a parte sobre o nosso "eu" estar sempre em mutação... Você sempre acrescenta tanto aqui nos comentários que às vezes fico até sem palavras pra responder. Muito obrigado mesmo, mais uma vez!

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  3. Sobre se vender ou não em troca de sucesso, de se falsificar para estar na mídia e essas coisas, é um tema que ocorre com certa frequência no blog do Humberto Gessinger, outro blog que acompanho. Pra quem não sabe, ele é um músico multi-instrumentista, líder do Engenheiros do Hawaii, atualmente metido em vários projetos pessoais paralelos. Deixo o link do blog dele (http://blogessinger.blogspot.com.br/) e um trechinho de uma música dele, Exército de Um Homem Só:

    “Não importa se só tocam
    O primeiro verso da canção
    A gente escreve o resto sem muita pressa
    Com muita precisão
    Nos interessa o que não foi impresso
    E continua sendo escrito à mão
    Escrito à luz de velas quase na escuridão”

    Seu blog se nutre justamente de sua originalidade e espontaneidade; considero seus textos autênticos, talhados como o trabalho de um artesão, bem fundamentados, procurando provocar algo do lado de lá da tela, e seria algo injusto não ter resposta. Acho que você fechou com chave de ouro o texto: “O quanto de você mesmo você é? O quanto da sua essência foi perdida?”. Perfect!

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    1. Wow, cara! Comparar meus textos com o trabalho de um artesão foi incrível. Só tenho a agradecer por estar sempre aqui lendo e participando! Muito obrigado de novo!

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  4. Ooi! Sinto que estou me tornando repetitiva: adorei seu texto! Hahahaha

    Eu tenho uma paixão por livros e sonho com um dia abrir uma livraria, mas enquanto não tenho dinheiro e experiência na área continuo buscando-as através de trabalhos pequenos em livrarias e cursinhos que possam abrir minha mente para o empreendedorismo. Não sei se estou certa agindo dessa forma, porém ainda não me sinto segura o suficiente para abrir um negócio. Enfim, de qualquer forma, isso continua sendo um caminho para chegar ao objetivo da minha vida hoje: abrir a livraria. Meu penúltimo emprego foi em uma grande livraria, porém nesse último acabei escolhendo ficar com o emprego mais rentável à ganhar mais experiência com livros. Sabe, esse seu texto e fez pensar sobre minha situação, e isso é ótimo.

    A frase que mais me chamou atenção foi :
    "Provavelmente porque o que consideram como felicidade, como sucesso, não é glória ou dinheiro, mas sim defender o que ama e ser reconhecido por isso.'''

    Abraço, continue sendo espontâneo e original por favor!
    Textos sempre muito parecidos é o que mais me cansa nessa internet.

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    1. Abrir uma livraria, que sonho massa! Como foi citado em outros comentários, muitas vezes é natural nos depararmos com situações onde precisamos nos afastar daquilo que queremos por um "bem maior" - em alguns casos, conseguir pagar as contas, né! hahaha
      Mas tudo depende de cada situação, de cada contexto. No seu caso, o sonho da livraria parece bem vivo. Torço muito pra que dê certo!
      Obrigado por comentar mais uma vez e pelas palavras de incentivo. Significam muito, de verdade! ;)

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